Já é um assunto recorrente aqui na Achou Gastronomia e na comunidade gastronômica a preocupação com o mercado da alimentação diante da pandemia COVID-19. Impossibilitados de funcionar de forma integral, com serviço de salão, os empreendedores estão desenvolvendo outros métodos em seus negócios para não pararem por completo nesta crise.
Algumas empresas, como a Ambev com sua marca Stella Artois, e Nestlé (que entrou há pouco na campanha #apoieumrestaurante), estão tentando alternativas para ajudar os restaurantes a sobreviverem durante esse período, pois somente a atividade em delivery não ajudará por muito tempo.
Esse período de Páscoa que é tão esperado por consumidores e lojistas, pois a demanda é muito grande pelos produtos; se encontra em um momento histórico, com ruas vazias, lojas fechadas e casas sem ovos de chocolate. Da mesma forma os restaurantes, principalmente àqueles que trabalham com peixes e frutos do mar que são os mais consumidos nessa época pascoal, que antes eram locais de socialização e encontro, agora estão temporariamente fechados ou trabalhando somente com entregas.
Como já conversamos anteriormente aqui na Achou, o delivery se tornou o meio mais visível e eficaz de vendas durante a pandemia, principalmente quando falamos da implementação de plataformas online, uma vez que temos basicamente a internet para nos comunicar e ficamos cada vez mais conectados com o mundo externo por meio de um dispositivo móvel. Mas até que ponto o serviço de delivery dessas plataformas se mostra viável, mesmo, ao empreendedor?
Se por um lado, ele oferece a estrutura: o serviço de pagamento online e a maquininha de cartão que o pequeno empreendedor não tenha, assim como o próprio serviço de entrega com o motoboy licenciado diretamente pela plataforma; por outro, as taxas são muito altas e acabam por muitas vezes, tirando mais do que a margem de lucro do produto. Para pequenos e médios empreendedores, isso pode ser o fim da empresa, também.
No Ceará, a plataforma online iFood entrou em acordo com a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (ABRASEL) e reduziu suas taxas e anteciparam os pagamentos recebidos pelas vendas realizadas nos aplicativos, para que empreendedores de todos os tamanhos consigam arcar com as despesas durante esse período de quarentena do isolamento social, segundo informações cedidas por Vanessa Santos (consultora gastronômica do SENAC-CE e membro da Associação Cearense dos Chefs de Cozinha – ACC) em live no Instagram, com o Observatório Cearense da Cultura Alimentar (OCCA) na quarta-feira, 25. Mas para alguns órgãos, somente essas reduções não bastam.
Foi ao ouvir os problemas de alguns desses estabelecimentos que o empresário Felipe Lo Sardo e sua equipe decidiram criar uma opção para facilitar as vendas online do comércio. Lo Sardo é fundador e presidente da startup Goomer, especializada em digitalização de restaurantes e terminais de autoatendimento — com clientes como KFC, Spoleto e Jeronimo Burger.
Em poucos dias, a empresa conseguiu colocar no ar a ferramenta GoomerGo, que permite aos estabelecimentos publicar seu cardápio online e receber pedidos de forma automática pelo WhatsApp. Com duas semanas no ar, a plataforma já atraiu mais de 2.500 estabelecimentos.
Todo o intuito da ferramenta é possibilitar que estes pequenos negócios, que não tinham operação online, possam vender pela internet de forma mais organizada — e não recebendo vários pedidos despadronizados no WhatsApp ou com cardápios pouco profissionais, como é comum em pequenos negócios.
A startup diz que, com o GoomerGo, consegue aumentar as vendas do estabelecimento em 20% na internet em relação ao uso comum e sem tecnologia do cardápio e do WhatsApp.
Não há um aplicativo da Goomer que reúne os restaurantes, como no caso de outras plataformas como iFood, Rappi ou UberEats. Para vender, o estabelecimento precisa divulgar o link de seu cardápio na Goomer para os clientes. Depois, o cliente faz o pedido de forma padronizada, com as ferramentas da interface da Goomer, adaptadas para cada restaurante. Por fim, a plataforma gera um texto no WhatsApp de forma padronizada, que o cliente envia ao restaurante.
Transferido o pedido para o WhatsApp, o cliente e o atendente do restaurante podem continuar conversando. A entrega fica por conta do próprio estabelecimento — como muitos não tinham essa estrutura, há casos em que o delivery é feito até por amigos ou parentes do pequeno comerciante, conta Lo Sardo. Tudo vale na hora de vender. Os estabelecimentos também podem usar o GoomerGo com a opção de retirada no próprio local. Se optar por essa modalidade, o cliente ganha um desconto.
Com as funcionalidades da nova plataforma, a Goomer conseguiu uma parceria com a cervejaria Heineken, que está incentivando os milhares de bares e restaurantes que vendem a cerveja a oferecerem os produtos online. A Heineken também vai patrocinar a divulgação dos cardápios na GoomerGo por meio de seu time de vendas.
“A plataforma GoomerGo surge como uma solução importante para os bares e restaurantes menores que muitas vezes não possuem nenhuma forma de e-commerce”, disse em nota à revista EXAME Jussara Calife, diretora de Trade On Premisse e Off Premise do Grupo Heineken no Brasil. O objetivo, diz a cervejaria holandesa, é ajudar os pequenos negócios a se manterem rentáveis em meio à pandemia.
Mesmo antes do começo oficial da quarentena, bares, restaurantes e outros pontos comerciais físicos já viam a operação ser amplamente reduzida. Em meados de março, a Goomer já notava queda de 25% nos pedidos em seus terminais físicos. O segmento de bares e restaurantes teve queda de 43,4% do começo de março até o dia 6 de abril, segundo dados da Cielo. A venda de bebidas alcoólicas também caiu 52% na segunda quinzena de março, de acordo com a Associação Brasileira de Bebidas (Abrabe).
Tecnologia nos restaurantes
Lo Sardo e os colegas Rafael Laganaro e Daniel Wassano, co-fundadores e hoje também diretores da Goomer, começaram a trajetória no empreendedorismo em 2014. Naquele ano, criaram serviços de autoatendimento para facilitar check-in e check-out em hotéis — em meio ao auge do otimismo com o turismo no Brasil com Copa do Mundo daquele ano e as Olimpíadas de 2016.
A relação com os hotéis os fez se aproximar dos restaurantes nos locais. Foi no setor de alimentação que o trio percebeu que havia uma oportunidade para ajudar os espaços na digitalização. “Os restaurantes ainda não haviam feito mudanças de tecnologia para aprimorar seus processos, e viam a margem que era de 20% cair para 15%, 10%”, diz Lo Sardo.
A Goomer trouxe então processos como cardápio em tablets e celulares para o garçom, tornando os pedidos cerca de 30% mais rápidos. O fundador conta que muitos restaurantes tinham medo de, ao implementar a tecnologia, perder a humanização no contato com o cliente. “Com o uso, eles viram que, se o garçom gasta menos tempo anotando os pedidos, sobra mais espaço para um melhor atendimento”, diz Lo Sardo.
Depois do cardápio automatizado, a empresa lançou sua ferramenta mais conhecida até hoje, que são os terminais de autoatendimento. “Vimos que havia espaço também para melhorar as praças de alimentação, onde havia muita fila e atendimento ruim”, diz o presidente. Dentre os clientes das ferramentas de digitalização da Goomer, estão nomes como Madero, KFC, Gendai e Jeronimo Burger (neste último, todo o pedido é feito pelo próprio cliente nos terminais).
Com os dados que coleta com o autoatendimento, a Goomer quer cada vez mais ajudar os restaurantes a otimizar o cardápio e a relação com os clientes como um todo. “Ninguém mais acha bom ir a um restaurante e encontrar um cardápio com dezenas de opções que você nem sabe o que é. Ajudamos os lugares a conhecer o que de fato o cliente quer”, diz Lo Sardo.
A ideia de lançar uma ferramenta de contato direto com os clientes como a GoomerGo já existia antes do coronavírus, embora a empresa ainda não estivesse certa sobre qual formato usar. Mas o plano foi acelerado — e as dúvidas foram solucionadas — em meio à pandemia e pela própria demanda das empresas clientes.
A briga no mercado de refeições online, no entanto, está longe de ser fácil — e fez até a espanhola Glovo desistir do Brasil em 2018. Neste cenário, há espaço para brigar com nomes como Rappi, iFood e UberEats depois da pandemia? Lo Sardo afirma que em plataformas mais consolidadas de delivery, é difícil para os pequenos restaurantes se destacarem e conseguirem fidelizar um cliente em meio a tantas opções.
Na visão do fundador da Goomer, a maior vantagem do GoomerGo é possibilitar ao restaurante ou bar continuar mantendo contato direto com seu cliente via WhatsApp, sem depender somente da plataforma. “Eu te diria que, há algumas semanas, realmente não dava para brigar com outras ferramentas mais estabelecidas”, diz Lo Sardo. “Mas tudo mudou em 15 dias.”
Fonte: Revista EXAME.